Folha.com - Sergio Malbergier - Não tuite isso, por favor - 29/07/2010



Eu estava discutindo sobre este assunto há alguns dias e hoje li este artigo. Bastante providencial, eu diria.
Talvez só estejam à salvo aquelas pessoas que criaram perfis falsos para se relacionar, e os mantém ativos durante anos.
Lógico que muitas delas cometeram deslizes durante todos esses anos ludibriando seus supostos amigos, mas algumas continuam a trama com muita excelência.
Para o azar dos pobres coitados que não criaram um personagem fictício e tiveram suas informaćões pessoais 'eternalizadas' pela Grande Rede, segue:


A frase acima tem sido ouvida em Manhattan cada vez com mais frequência, relata o "New York Times" na reportagem "O fim do esquecimento", na capa de sua excelente revista dominical.

A tese é que a internet é um fundo infinito que guarda tudo para sempre, incapaz de defender reputações e com mecanismos de busca cada vez mais precisos para localizar qualquer desvio de conduta uma vez registrado.

A web tornou-se, entre muitas outras coisas, plataforma global para o exibicionismo 3.0. Há um revelador e crescente apetite para exibir amigos, gostos, fotos, músicas, seguidores, localização, programas, enfim, a vida. E um eterno apetite por notícias ruins. "Bad news, good news" sempre foi a lógica do noticiário replicada (e acentuada) na internet.

Por isso é preciso tomar cuidado com o que você faz quando mergulha nesta tela aqui. Atrás dela estão bilhões de olhos, ouvidos, bocas e dedos digitadores.
Relata o artigo do "Times":

1) O Facebook já tem 500 milhões de membros, ou um em cada cinco internautas. Todo mês eles gastam mais de 500 bilhões de minutos no Face e compartilham 25 bilhões de conteúdos.

2) O Twitter tem mais de 100 milhões de usuários, e a Livraria do Congresso americano anunciou que armazenará permanentemente todos os posts públicos do Twitter desde 2006.

3) Técnicas de reconhecimento facial já permitem que se vasculhe a web em busca da foto de uma pessoa mesmo que o nome dela não esteja associado à imagem.

Estamos registrando tudo na web, uma exposição tão genuína quanto voluntária.

Queremos nos relacionar, e se relacionar é se exibir.

Se antes era possível exibir, relacionar e depois esquecer, hoje há uma chance enorme, tanto maior quanto mais digitalizada a pessoa, de você mesmo registrar para a prosperidade o que você um dia vai querer muito esquecer.

Uma canadense de 66 anos, relata o "Times", perdeu o direito de entrar nos EUA depois que o funcionário da imigração achou na internet texto seu elogiando o LSD. Já uma professora americana perdeu o emprego por ter postado uma foto sua numa festa exaltando bebidas.

Já há um aplicativo para o iPhone chamado Date Check, que oferece perfil sobre a pessoa com quem você quer sair vasculhando fichas criminais, histórico de endereços e informações obtidas nas redes sociais.

A enorme maioria das empresas dos EUA já usa redes sociais para checar candidatos a empregos. As brasileiras fazem ou logo farão o mesmo. Aquela sua foto bêbado com cigarro na boca que você ou um amigo seu postou um dia desavisado pode aparecer no meio da sua entrevista.

Os americanos, que inventaram tudo isso, já estão dando o próximo passo.
Nasce a indústria da reputação digital: o que já é feito para empresas, entes públicos por natureza, chegou à pessoa física, cada vez mais pública.

Um professor de cyber legislação de Harvard já defende a "falência de reputação", que poderia ser decretada pela pessoa que se sente incapaz de defender sua imagem na internet. Decretada a falência, arquivos difamatórios poderiam ser eliminados.
O Google já tem um serviço que tenta combater postagem sob influência do álcool, que pode causar quase tanto estrago quanto dirigir bêbado. Acionado o mecanismo, o usuário terá de resolver um simples teste de matemática para confirmar o envio do post/mensagem.

A internet é a mudança mais transformadora da história recente. Ela conecta todas as pessoas o tempo todo. E isso é um avanço fundamental, seminal, que está apenas começando a se realizar.

Acho que foi o filósofo Woody Allen que disse que se um extraterrestre analisasse a Terra, o sofrimento que os homens causam a outros homens chamaria mais a atenção do alienígena do que nossos grandes feitos na engenharia, nas artes, na economia.
Dada essa tendência, e a permanência da internet, talvez seja melhor mesmo você não tuitar o que está pensando.



Folha.com - Sérgio Malbergier - Não tuite isso, por favor - 29/07/2010

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